quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Havia uma pedra...




Faz um bom tempo que eu não dou trela ao meu coração. O pobre coitado gritava sempre: “havia uma pedra no meio do caminho”, há uma pedra no meio do caminho!
Quem não conhece esse belíssimo poema de Carlos Drummond de Andrade? Pois é, o fato é que este poema para os dias de hoje ganha corpo, alma e até mesmo dor. Dor para quem é a “pedra” e dor para quem ver a pedra no meio do caminho: “Nunca me esquecerei desse acontecimento; na vida de minhas retinas tão fatigadas, nunca me esquecerei que no meio do caminho tinha uma pedra...
Preciso dizer a mocidade de hoje que a pedra tão citada pelo poeta é uma pedra de carne, osso e sentimento. Uma pedra que passa fome, frio, sede e vive exposta às mais diversas violências. Há uma pedra no meio de nosso caminho que é desprezada e algumas vezes vista como de fato fosse uma pedra. Eu pergunto, somos desumanos ou somos pedras para permanecermos inertes?
Quando voltava para casa, analisando cada pessoa que estava do lado de fora do ônibus, questionava porque ver tantas humanos passando necessidade me incomodava tanto. Porque não conseguia me acostumar com cenas típicas de quase todas as capitais, e porque mesmo sendo doloroso para mim, eu continuava sem fazer nada com relação a esta triste realidade. Certa vez escrevi sobre O choro do silêncio natalino, e mais uma vez verei que o natal é cercado de choros, choros do silêncio. São crianças e jovens nos sinais, segurando uma flanela qualquer para adquirir alguns trocados. Horas e horas debaixo do sol e no frio da noite para que na madrugada, tenha um trocado para saciar a fome do vício. Pobres pequeninos, que a cada dia perdem um pouco de suas vidas... Vejo logo nas calçadas, crianças que há muito deixaram de ser criança. Vejo meninas que se tornaram adultas de forma prematura e agressiva para consigo mesmas. São pequeninos que reviram o lixo em busca do pão que saciará uma parte da fome guardada há vários dias. Qual não foi a lágrima que rolou do meu rosto quando vi um pobrezinho encontrar uma batata podre e sair com um sorriso no rosto mastigando aquele resto como se fosse a melhor coisa do mundo...
No meio do caminho tinha uma pedra” que me fez pensar e repensar que a nossa sociedade precisa se tornar mais cristã. Onde estão as autoridades? Será que precisamos esperar pelo Estado? Porque não deixar nosso lado humano agir? Será muito mais prático um a um deixar-se seduzir pela ação doadora de si do que esperar apenas pelos “reais” responsáveis para que resolvam algo. Mas, eis aqui apenas um pensamento movido por um espírito idealista.
Espírito idealista que com o tempo perdeu-se, pois infelizmente a sociedade não está preparada para assumir tamanha responsabilidade, infelizmente nossa sociedade ainda é individualista e mesquinha, infelizmente a nossa sociedade tem muito para aprender sobre o que vem ser de fato humanidade.
Nunca me esquecerei desse acontecimento; na vida de minhas retinas tão fatigadas, nunca me esquecerei que no meio do caminho tinha uma pedra...
São Luís, 01/11/2012
Aline Xavier Bras

Nenhum comentário:

Postar um comentário